Dez anos para cidadania “vão colocar imigrantes para fora do país”, diz especialista
Autora de livro sobre a legislação de naturalização avalia consequências do possível aumento do tempo para se obter a nacionalidade portuguesa, proposta do atual Governo, caso seja reeleito.
O aumento do tempo de residência em Portugal para que os imigrantes obtenham a nacionalidade portuguesa vai afastar imigrantes do país e fazer com que o processo fique mais caro. É o que afirma a advogada Letícia Bahia Pardal, 51 anos, autora do livro Nacionalidade e Direitos Humanos, escrito com base na sua dissertação de mestrado em Direito Internacional Público, defendida em 2022 na Universidade de Lisboa. Para ela, ter a cidadania é o que a filósofa Hannah Arendt considerava ser o direito a ter direitos.
A proposta do atual Governo é de, se reeleito, ampliar o tempo de residência em Portugal para a conquista da cidadania, com indicações de que pode chegar a até 10 anos. Integrantes da equipe do primeiro-ministro, Luís Montenegro, acreditam que o processo de nacionalidade por aquisição, como está hoje, não é o recomendável. Há quase meio milhão de pedidos de cidadania encalhados no Instituto dos Registros e do Notariado (IRN).
Em Portugal desde 2008, a carioca Letícia formou-se em direito empresarial e, no Brasil, trabalhou na Embratel, do setor de telecomunicações. Ela conta que atravessar o Atlântico foi uma uma forma de mudar de vida. Com um escritório em Cascais, onde trabalha com uma advogada portuguesa e outra brasileira, atua nas áreas de imigração, vistos, nacionalidade, assessoria jurídica, contratos imobiliários, além de direito de família. Veja os principais pontos da entrevista concedida ao PÚBLICO Brasil.
O atual Governo português anunciou que, se for reeleito, proporá o aumento do prazo de residência em Portugal para que imigrantes possam obter a nacionalidade lusa. O que isso vai implicar?
Hoje, o prazo mínimo de residência é de cinco anos. Para aumentar esse prazo para sete, oito ou 10 anos, o que o Governo alega é que o estrangeiro tem que ter maior ligação ao país. Isso implica, basicamente, em maior gasto para o imigrante, porque, quanto mais tempo ele ficar dependente de uma autorização de residência, mais despesa para ele. Uma autorização de residência é cara, a manutenção da sua vida aqui em Portugal também custa, porque ele sempre é tratado como um estrangeiro, nunca como um nacional. Isso implica gastar na saúde, gastar mais até com transportes, porque ele também tem menor acesso aos cartões dos meios de transporte. O custo de medicação também aumenta, porque, às vezes, o imigrante não tem inscrição ativa no Serviço Nacional de Saúde (SNS), e enfrenta maiores dificuldades para os recolhimentos à Segurança Social para fins de reforma. Volta e meia, o Governo faz alterações no que é preciso para obter o título de residência, uma vez, pode, outra vez, não pode, uma vez tem que ter contrato, outra vez, não tem. São demandas que afetam muito a vida do estrangeiro, e eu acho que isso pode provocar um desinteresse pelo país.