Da série “vamos começar pelo começo”. Gastronomia, na minha definição, é a cerimônia que envolve e distingue uma refeição “normal” de um almoço ou jantar contextualizados. Pode ser em um restaurante cinco estrelas, na casa de um gourmê de alta gama … ou em um quiosque chique. O que vai fazer a diferença é o ambiente do recinto e do exterior, a proposta do menu, dos drinques ou dos vinhos, a companhia, a música, a iluminação, o serviço e até do espaçamento entre as mesas e da decoração das próprias: o arranjo de flores (ou não), a disposição das taças, copos e talheres; a temperatura do cômodo, os não-ruídos e até, em última análise, o tom e tema das conversas.

Gastronomia de rua – cartaz
Bom, no caso da chamada “gastronomia de rua” alguns desses itens se invertem. Ou se convertem, porque o espaço do convívio é indiscriminado e há que se tolerar uma algazarra suportável aos ouvidos, e uma divertida informalidade. É o espaço aonde se come em quiosques, barraquinhas, carrocinhas, sentado em bancos de jardim ou na grama/areia, e até em pé, saboreando um acarajé em cima de um guardanapo de papel… o que antigamente se chamava piquenique.
Parênteses: essa informalidade não pode ser confundida com outra linha do comer que é o sanduíche. Dele, vale apenas esta curiosidade: no século XVIII um aristocrata inglês, John Mantagu, conde da cidade de Sandwich, localizada no condado de Kent, e sendo um jogador de poker inveterado, bolou a solução de se alimentar sem sair do carteado: dois pedações de pão com uma fatia de carne assada ou rosbife dentro. “No comments”. Um salto no tempo: neste fim de semana que passou, 2/2, participei de uma alegre reunião de amigos no quiosque Tropik Beach Club, no Posto 6, em comemoração ao Dia de Iemanjá, tradicional encontro organizado há 20 anos pelo craque Nilo Sérgio Félix. E lá tive o prazer de papear com o pioneiro João Barreto que fará 80 anos neste novembro. Está inteiraço e bem-humorado. Pois bem, no longínquo ano de 1962, esse cearense recém-chegado do seu Cariri instalou a primeira carrocinha de cachorro-quente na quase deserta Praia da Barra da Tijuca. E na onda (talvez?) da fama da Bob’s, em Copacabana, batizou-a de Jonn’s. Nunca mais parou de crescer.

A barraca Jonn’s
Estava lançada uma cultura de praia que ia além da areia e do banho de mar. Hoje, e depois de ter criado em 1990 o Projeto Rio Orla, as carrocinha se transformaram em quiosques modernos, confortáveis, com música ao vivo, toda a estrutura sanitária e hidráulica, e que oferecem de petiscos saborosos e originais a refeições completas e sofisticadas, champagne, espumantes, bons vinhos e drinques criativos. E para comer, ostras, tartares, frutos do mar, ceviches, massas e tudo o que um restaurante moderno pode apresentar. E o mais importante: tornaram-se, também, espaços de convívio, aniversários e até casamentos!
Não por acaso há muitos anos o teatrólogo, escritor e gourmê Guilherme Figueiredo, dizia “o Rio é uma cidade lambida pelo Atlântico, untada pelo azeite do português, mas ardendo em pimenta africana”. Por isso, digo eu, tornou-se essa Babel bem sucedida!
Por Reinaldo Paes Barreto