E tem muitas gente que não só não gosta (graças a Deus), mas ainda faz “eca”, com caretas de nojo, e chama de caracol (*) a esse personagem clássico da gastronomia francesa. Eu adoro. Mas que é um molusco muito doido, lá isto é. Para começar é hermafrodita, e o acasalamento é precedido por uma fase de toques que duram cerca de 20 minutos, durante os quais eles ficam lado a lado, em sentidos opostos, e por fim se penetram reciprocamente durante longas horas.
Anatomia do Escargot
Além disso, os escargots são invertebrados, herbívoros, dotados de uma concha calcária que lhes serve de abrigo e proteção — e notívagos! Ou seja, eles só se alimentam à noite e basicamente comem alface, couve, bardana, cenoura, pepino e chuchu, quando estão na natureza. Mas podem se alimentar de uma ração seca, preparada em casa, ou industrialmente, quando a criação é em viveiros. Curiosidade: os escargots aparecem na alimentação humana desde a era Paleolítica e a prova é a grande quantidade de conchas encontradas pelos arqueólogos, próximo às cavernas desses antepassados pré-históricos. Depois, na Idade Média, foram criados nos mosteiros e largamente consumido durante as vigílias e dias em que era proibido se comer de carne, como na Sexta-feira da Paixão. Ou, dependendo se a congregação era mais rígida, durante toda a Quaresma.
Mas vamos ao que importa, para quem importa (com trocadilho) congelados, ou em lata. Aí vai a receita clássica, francesa: 12 escargots, 1 maço de cebolinhas, 1 folha de louro, ½ maço de manjericão, 50g de manteiga sem sal, 2 colheres de conhaque, ½ maço de salsinha, 1 ramo de alecrim, 15 gramas de alho socado, sal e pimenta. Modo de preparo: junte todos os ingredientes e os temperos, e acomode tudo na manteiga com ervas. Depois, coloque esse “combo” nas conchas do próprio escargot, ou nas cavidades do prato de louça ou metal apropriados; pré-aqueça o forno por 10m em temperatura de 200 graus e deleite-se — não com leite, por favor, com um bom vinho para escolta-los com prazer.
Escargots à mesa
A criação comercial de escargots chama-se helicultura e, no Brasil, teve início no final da década de setenta, com criadores no Paraná, São Paulo e Rio de Janeiro, sobretudo na serra fluminense. Tanto que a Universidade Federal Rural, por exemplo, começou já neste século XXI a ministrar cursos técnicos, orientando os produtores iniciantes a andarem devagar (como os próprios!). Isto é, para quem está começando, o ideal e iniciar com 60 matrizes de escargots, instalar os viveiros em um ambiente com umidade do ar acima de 80% e água potável.
Curso para criação de escargots
Já na mesa, eu prefiro harmonizá-los com vinho branco Riesling, ou Sauvignon Blanc, de qualquer boa procedência. E o consumo por refeição pode ser de meia-dúzia, de entrada e depois um prato principal, ou 12 unidades na refeição toda, e depois uma padre-nosso. Em tempo: eu também prefiro apreciá-los no almoço e quando a tarde é livre. Inclusive para uma merecida sesta!
(*) A diferença entre escargot e caracol é que o escargot é da espécie Helix, comestível, entre outras. E muitos caracóis são selvagens, impróprios para o consumo humano.
Por Reinaldo Paes Barreto