E a primeira pergunta, é: as pessoas usam máscara para o Carnaval ou tiram a máscara para o Carnaval?

Vamos em frente: a fantasia (com trocadilho) de “brincar” de ser outro, é velha como as pirâmides de Guizé, no Cairo. Desde as máscaras do tribalismo africano, passando pela “maquiagem” dos indígenas, pelas divindades orientais e, sobretudo, pela projeção da “persona”, no teatro grego, o ser humano sempre se sentiu tentado a ser (também) um outro. Por uma noite, por um período determinado (Carnaval, Semana Santa em certas liturgias, bailes temáticos… espiões) ou por muito tempo, caso dos bandidos e criminosos, dos foragidos…

E o Carnaval é o território ideal para esse jogo entre o ego e o anonimato. O qual jogo encontrou a sua oportunidade de ouro em Veneza, no século 2 da nossa era, quando um dodge (o mandatário supremo, da época) decretou que a população tinha direito de se divertir em público com música, dança e exibições de roupa exóticas antes do início da quaresma. Não deu outra.

Mas como toda festa popular que mobiliza grandes massas, o Carnaval traz no seu enredo a contraditória característica de mesclar a alegria quase infantil do pulo, da música repetida pelo refrão, com a descarga de uma represada violência.
Uma espécie de catarse coletiva.

A história e curiosidades do Carnaval de Veneza

Em Veneza, por exemplo, havia o “desafio dos socos”, em que os homens se reuniam na Ponte dei Pugni (ponte dos socos)  para trocar sopapos.

E, no Brasil, havia a prática do “entrudo”, brincadeira falsamente inocente que vem desde a época da Colônia, e se estendeu pelos dois impérios, em que a “lógica” era jogar água, farinha, polvilhos, limões, lama e até urina, nos outros. E, pasmem: dentro de casa, mesmo senhoras e donzelas “de fino trato” se divertiam fazendo o mesmo, numa verdadeira explosão de sentimentos reprimidos.

Nos tempos da lança-perfume muita gente se machucou com a explosão das garrafinhas.

Para finalizar, e sem querer dar uma de Freud com esse calor, mas esse “outro(a)”, mascarado, pode ser o seu “algoz” como na peça de Sartre “o inferno são os outros”, pode ser o “o outro do outro”, como na teoria lacaniana (ou seja, é através desse não-eu que o indivíduo se identifica), ou pode ser a tentação de transgredir com o/a mascarado/a, como na marchinha do Chico Buarque,  “seja você quem for, seja o que Deus quiser”.

Com todo o respeito, “quem não tem seu sassarico, sassarica mesmo só” (epa! prazeres solitários?)

Um bom Carnaval para todos!

Por Reinaldo Paes Barreto