Li, numa mídia social a propósito do Dia de São José, (*) esta promessa para o santo-carpinteiro: no dia 19 de março, e até a meia noite, escreva em uma folha de papel todas as frutas que é capaz de reconhecer. Recorte e dobre os papéis com os nomes colocando-os em uma caixa/sacola como em um sorteio. Converse com o santo e faça o seu pedido com fé. Retire um dos papéis. A fruta cujo nome estiver escrito ali deve ser evitada até o dia 19 de março de 2025…”

 

 

Bom, mas com todo o respeito pelos devotos de São José (e de outros santos), eu pergunto: será que um sacrifício a meu ver bobo – não comer maçã durante um ano, ou acerola, ou lichia – “agrada” ao santo a ponto de ele/ela atender um pedido supostamente difícil? E não comer uma fruta, ou beber cerveja, etc, não atinge o organismo. Mas há as promessas realmente radicais: os que se propõem a subir a pé, descalços, os 382 degraus da escadaria da Igreja da Penha, ou percorrer de joelhos 127m do pátio do Santuário de Fátima, perto de Lisboa, por aí. E a pergunta continua a mesma: será que “eles” nos querem sofrendo tanto, fisicamente, comprometendo às vezes a saúde, para obter uma graça?

Não me parece. E não seria mais razoável prometer aos santos adotar uma criança ou até um pet abandonado? Ou, se não puder acolher em casa um ser vivo, carente, pelo menos custear o tratamento, estudo, remédios caros, etc, etc,  de uma criança, ou idoso, ou deficiente? E/ou levar para um passeio, ou passar uma tarde em um abrigo, com eles?  Repito, será que não “gera mais crédito” com a corte celeste um gesto de generosidade humana transformador, em vez de um calvário aparentemente inútil sem benefício direto para os demais humanos?

Vou mais longe. Acho que pedir com fé e confiança a um(a) santo para que interceda junto ao Cristo a fim de obter(mos) uma graça (e até um milagre!) não precisa estar vinculado a uma “contrapartida” sofredora. Uma velhinha enferma se privar de sorvete durante um ano para que São Camilo de Lellis (**) lhe cure as dores do lumbago, me parece tão inócuo quanto achar que dá para debelar um incêndio florestal com uma caneca de água gelada.

Ou seja, mesmo na “cabeça” das entidades espirituais, acho que os santos são pragmáticos…

(*) São José é uma figura aparentemente apagada (não induz Jesus a realizar milagres, não foi martirizado e nem converteu pagãos), mas “graças a ele Maria não foi morta devido a uma “incompreensível” gravidez, em um país machista e preconceituoso, e graças a ele o filho de Deus teve uma infância “normal” até se revelar o líder espiritual máximo do Cristianismo”, e sofrer o destino que o Pai lhe reservou, como o descreve a teóloga e escritora italiana Michela Murgia.

(**) São Camilo de Lellis (1550-1614) era italiano e o santo padroeiro dos doentes, dos hospitais e dos profissionais de saúde.

Por Reinaldo Paes Barreto